Modelo Baseado em Valor está atrelado à tecnologia e à mudança de cultura
ara especialista que participou do e-saúde, formação nas universidades terá papel fundamental nessa transformação
A solução de uma série de problemas passa pelo bom uso da tecnologia, levando à transformação de todo um setor. No entanto, se a sua aplicação demandar mudança de cultura, a velocidade de transformação pode ser mais lenta do que a desejada. É isso o que está acontecendo como um dos grandes desafios nos dias de hoje: encontrar um modelo de remuneração por serviços que atenda às necessidades atuais da gestão em saúde.
Os chamados modelos baseados em valor, com foco no paciente e em resultados, tornaram-se alvos de debates em contrapartida ao sistema Fee For Service, considerado saturado, mesmo que continuamente aplicado na cadeia da saúde. Diferentes levantamentos apontam que ele está relacionado com a super utilização e os gastos desnecessários. Muitos especialistas defendem a mudança, como Márcio de Castro Ferreira, colaborador ICHOM – International Consortion for Health Outcomes Measurement – do Hospital do Coração (SP) para doenças articulares degenerativas e coordenador da Gestão de Alto Custo OPME da Seguros Unimed. Ele proferiu palestra sobre o tema durante o painel “Modelo Baseado em Valor” no e-saúde, promovido pela Unimed Paraná.
“Por que precisamos mudar isso? Porque a situação está muito ruim. No Brasil, temos uma inflação médica altíssima, proporcionando uma divergência muito grande, mais do que o dobro da normal. Temos queda na renda per capita dos brasileiros e aumento no desemprego. Tendência de planos de saúde mais básicos, e menor capitalização das operadoras. Além disso, a população está envelhecendo”, afirmou.
Ferreira enfatiza que a implantação de um modelo baseado em valor não acarreta em um “simples” corte de custos, e sim em controle do desperdício e foco em efetividade no desfecho clínico. “Para conter o desperdício, alguém vai ganhar menos. O principal é controlar o custo e ter previsibilidade. É ofertar previsibilidade ao seu cliente e ele saber o que vai acontecer com ele e com custo determinado”, classificou.
O especialista considerou que a transição entre modelos ainda está em um estágio “embrionário” porque a condição cultural das práticas médicas ainda não permite que seja adotado verdadeiramente um sistema baseado em valor. “O modelo vigente é enraizado e muito perverso para quem o gerencia. Isso está insustentável do ponto de vista de gestão, próximo de um colapso. As pessoas entenderem que essa mudança é necessária é muito complicado. Esse é o maior desafio que o país tem, pois existe uma regulação para a saúde difícil de coincidir com essas perspectivas novas que a medicina de valor sugere”, indicou Ferreira, em entrevista à Revista Ampla.
De acordo com ele, a mudança de cultura pode acontecer com um ritmo mais acelerado se isso for trabalhado já na formação dos profissionais que atuarão na cadeia da saúde. “Quanto mais falarmos, melhor. Célula por célula vai tentando modificar, mas acredito que o alicerce esteja nas universidades. Esses alunos precisam estar cientes de que a medicina mudou. A visão de enriquecimento com a saúde precisa mudar. A gente precisa de sustentabilidade. A dosimetria está mais voltada para a meritocracia na medicina de valor”, opinou.
Também no e-saúde, Robson Capasso, médico e professor na Universidade de Stanford (Estados Unidos), frisou que a academia é o local para debater esses sistemas e a interação com a tecnologia. No entanto, isso não pode ser feito de qualquer forma. Em sua palestra “Novos Modelos de Negócios em Saúde”, ele defendeu a união dos profissionais da saúde e da área de tecnologia para chegarem a soluções que visem o melhor para o paciente, o que impacta também em um melhor desfecho clínico e aos critérios de uma medicina baseada em valor.
A interação com a academia não pararia por aí. Capasso acredita ser essencial o incentivo a um ecossistema de inovação em saúde com planejamento de médio a longo prazo, com participação de instituições de ensino, iniciativa privada e governo. Cada parte contribuiria com sua expertise para alavancar o desenvolvimento sustentável dentro de novos modelos no setor. A iniciativa privada entraria com investimentos; as universidades formariam a estrutura para um centro de inovação; os hospitais universitários continuariam sendo locais para a prática; e outras instituições poderiam trabalhar projetos e fomento nessa área.
Tudo isso faz parte de planejamento. E, de acordo com Capasso, tecnologia e o planejamento podem garantir o sucesso na implantação de novos modelos de negócio em saúde. Exemplo disso está na atuação contra a readmissão precoce não necessária de pacientes. Nos Estados Unidos, 80% desses casos poderiam ser prevenidos. No entanto, eles retornam antes do tempo e geram custos não previstos.