Não está fácil para ninguém. A Covid-19 imprimiu um novo ritmo à vida de todos. À dos profissionais de saúde, não é diferente. O susto foi grande para a maioria. Muitos ao escolherem essa área já intuíam os riscos, mas a realidade, na maioria das vezes, se sobrepõe às expectativas. Foi o que aconteceu em relação à essa pandemia. Todos, no entanto, mantêm a convicção de que, no mínimo, sairemos dessa mais fortalecidos.
E você o que acha? Fomos ouvir o grupo de profissionais que trabalha no Centro de Atenção Personalizada à Saúde (APS), da Unimed Paraná. Veja o que eles disseram.
“Desde criança eu queria ser médico, gostava das matérias relacionadas com ciências e mais tarde eu entendi que seria um meio de me envolver com os problemas das pessoas de forma a ajudá-las no alívio do sofrimento. Apesar disso, nunca havia imaginado um momento como esse. A impressão inicial foi a de que estávamos vivendo um filme. Eu já trabalhei como voluntário com população ribeirinha no Amazonas, já atuei profissionalmente por anos em locais de escassez de recursos ou violência social extrema, mas nunca atuei em um cenário de crise global como esse.
Os médicos de família, no entanto, estão sempre são linha de frente. Por isso, eu achei que nos preparamos bem para isso. No início, todos nós pensávamos em como seria estar doente, se poderíamos em algum momento nos contaminar e ter um quadro grave. Como a doença é muito nova, não temos o controle do desfecho e por isso todos nos angustiamos muito. Ouvi uma vez a frase de um colega que trabalha no pronto-atendimento de um hospital: “é horrível trabalhar e não saber se hoje vou voltar para casa”. Foi essa a sensação que eu tinha muitas vezes. Felizmente, na APS, tivemos tempo para planejar as ações, estudar as possíveis saídas, discutir com a equipe sobre os possíveis cenários e indicar o melhor tratamento para nossos pacientes. Em nenhum momento nos sentimos desamparados pela gestão nem pelos colegas. Ver que o resultado do nosso esforço, estudo e cuidado tem sido positivo me alegra muito, é formidável.
Para mim, o período mais negro, desde que se iniciou essa pandemia, foi quando começamos a discutir os protocolos. Pensar que uma doença dessa poderia se abater sobre todos nós e os danos que poderia causar nas pessoas nos deixou bem preocupados. Seguiu-se então a discussão sobre o tratamento precoce da Covid-19 como estratégia para enfrentamento. Essa foi outra luta, talvez uma das mais difíceis, pois tivemos que assumir posições controversas em relação à mídia e a alguns colegas médicos. Recebemos críticas, pressões, mas seguimos com a certeza de estarmos caminhando com ética e também conhecimento científico. Esse apoio entre nós, foi fundamental, sem isso não teríamos conseguido prosseguir.
Não tenho receio de estar na linha de frente, teria mais se estivéssemos desorganizados, atendendo pacientes sintomáticos sem proteção (EPIs) e se não tivéssemos opção para tratar as pessoas e poder dar a elas uma segurança maior. Acredito que esse momento é um momento de muitos desafios. Todos estão sendo desafiados a mudar seus hábitos, conviver mais com a família do que com os colegas de trabalho (para os que estão em trabalho remoto), ter a responsabilidade direta sobre a educação escolar dos filhos e ter limitação para exercer algumas atividades, entre outras questões. Infelizmente, para muitos, representou ainda a perda do sustento da família. Também tivemos que aceitar a incapacidade da ciência em dar todas as respostas para o sofrimento. Sabemos que, em algum grau, todos estamos tendo prejuízos. Por outro lado, os desafios também trouxeram oportunidades. As famílias se aproximaram mais e a solidariedade pôde ser mais manifesta nesse momento de crise”.
Rodrigo Cechelero Bagatelli – médico de família