Regulamentação da telemedicina pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) aconteceu no início do mês
A prática da telemedicina como suporte ao atendimento médico deixou de ser utilizada em caráter emergencial pro conta da pandemia de Covid-19 e passou a ser regulamentada no país em 5 de maio, a partir da publicação da Resolução 2.314/2022 do Conselho Federal de Medicina (CFM). A resolução é uma correção do texto publicado em 2018 e revogado logo em seguida após manifestações contrárias de diversas entidades médicas.
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A nova regulamentação foi construída em conjunto com as entidades e após o recebimento de mais de 1500 contribuições em consulta pública. Com a publicação, os médicos brasileiros estão autorizados a praticar a teleconsulta, teleinterconsulta, telediagnóstico, telecirurgia, telemonitoramento ou televigilância, teletriagem e teleconsultoria.
Conceitos da telemedicina
Teleconsulta
Caracterizada como a consulta médica não presencial, mediada por TDICs, com médico e paciente localizados em diferentes espaço.
Teleinterconsulta
Ocorre quando há troca de informações e opiniões entre médicos, com ou sem a presença do paciente, para auxílio diagnóstico ou terapêutico, clínico ou cirúrgico. É muito comum, por exemplo, quando um médico de Família e Comunidade precisa ouvir a opinião de outro especialista sobre determinado problema do paciente
Telediagnóstico
A emissão de laudo ou parecer de exames, por meio de gráficos, imagens e dados enviados pela internet também passa a ser permitida e é definida como telediagnóstico. Nestes casos, o procedimento deve ser realizado por médico com Registro de Qualificação de Especialista (RQE) na área relacionada.
Telecirurgia
É quando o procedimento é feito por um robô, manipulado por um médico que está em outro local. Essa modalidade foi recentemente disciplinada pela Resolução CFM nº 2.311/2022, que regulamentou a cirurgia robótica no Brasil.
Televigilância
Também conhecido por telemonitoramento, consiste no ato realizado sob coordenação, indicação, orientação e supervisão de parâmetros de saúde ou doença, por meio de avaliação clínica ou aquisição direta de imagens, sinais e dados de equipamentos ou dispositivos agregados ou implantáveis nos pacientes.
Teletriagem
Realizada por um médico para avaliação dos sintomas do paciente, à distância, para regulação ambulatorial ou hospitalar, com definição e direcionamento do mesmo ao tipo adequado de assistência que necessita ou a um especialista.
Autonomia do médico
Vice-presidente do CFM e relator da resolução, Donizetti Dimer Giamberardino Filho, destaca que o texto dá autonomia ao médico na conduta terapêutica, sempre com foco na qualidade do atendimento oferecido; confere segurança e sigilo no trato de dados dos pacientes; fortalece a relação médico – paciente, com base na transparência e esclarecimento das condutas adotadas; e evidencia as etapas que devem ser cumpridas pelos médicos para que o atendimento seja realizado dentro de padrões técnicos, legais e éticos.
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A resolução estabelece que a telemedicina é “exercício da medicina mediado por Tecnologias Digitais, de Informação e de Comunicação (TDICs), para fins de assistência, educação, pesquisa, prevenção de doenças e lesões, gestão e promoção de saúde”. Segundo o texto, a prática da telemedicina por ser feita em tempo real on-line (síncrona) ou off-line (assíncrona).
Ao comparar o texto atual com a resolução revogada de 2018, Donizetti cita que a regulamentação avançou no estabelecimento da teleconsulta também como possibilidade de primeiro atendimento e no estabelecimento da territorialidade da atuação do médico, que, registrado em qualquer Conselho Regional de Medicina, poderá atender pacientes de qualquer estado brasileiro. “A questão da primeira consulta foi uma adaptação nossa à legislação que está para ser aprovada. Na resolução de 2018, era exigida que a primeira consulta fosse presencial, mas, como a Câmara dos Deputados aprovou, no seu projeto sobre a ‘telesaúde’ texto que vai de encontro a essa proposição, nós nos adequamos, para não estarmos em desacordo com a lei, mas fizemos ressalvas sobre a responsabilidade médica, a relação médico-paciente e as boas práticas médicas para balizar esse atendimento”, disse.
Para Donizetti, a pandemia ajudou a aumentar a compreensão da classe médica sobre a necessidade de se regulamentar a telemedicina e ter a prática como uma ferramenta de apoio ao trabalho médico. “Na medida em que, por uma questão sanitária, o governo, o Ministério da Saúde, autorizaram o uso da telemedicina, até com pouco regramento por conta da urgência da crise sanitária, a pandemia foi um impulso disruptivo para que a telemedicina passasse a ser usada. Muitos profissionais que eram contrários, tiveram, na telemedicina, a única forma de acompanhar seus pacientes no período mais crítico da pandemia e foram aceitando esse novo método propedêutico. Não é uma outra medicina, é apenas um método propedêutico de fazer a medicina. A mudança aconteceu pelo uso. Com o Congresso buscando aprovar uma lei definitiva sobre telemedicina, buscamos essa harmonização com o texto legal para firmamos essa resolução”, explicou.
O médico citou que a tecnologia influencia toda a sociedade e que não poderia ser diferente com a medicina. “A medicina é baseada na ciência, mas suas verdades são efêmeras. E, como se não bastasse isso, a tecnologia chegou para conviver com a sociedade e a medicina pertence à sociedade. Então, é lógico que a tecnologia vai influenciar na medicina: 5G, big data, inteligência artificial e telemedicina. O médico pode até tentar fugir dessa tecnologia, mas ela vai chegar. Defendemos que já haja capacitação para a telemedicina nos cursos de medicina, já com orientação para os cuidados com sigilo de dados, limites de uso, entre outros”, disse. “A telemedicina pode ser feita, mas tem que ser bem regulamentada. Os médicos não podem confundir telemedicina com videochamada, WhatsApp. É um recurso complementar, que vem para dar mais acesso das pessoas à saúde, para aumentar a qualidade, mas não para substituir o atendimento presencial”, concluiu.
Principais definições da resolução CFM 2.314/2022
Consulta presencial
O médico tem autonomia para decidir se a primeira consulta poderá ser, ou não, presencial. Reitera-se que o padrão ouro de referência para as consultas médicas, sendo a telemedicina um ato complementar. Os serviços médicos à distância não poderão, jamais, substituir o compromisso constitucional de garantir assistência presencial segundo os princípios do SUS de integralidade, equidade, universalidade a todos os pacientes.
Acompanhamento clínico
No atendimento de doenças crônicas ou doenças que requeiram assistência por longo tempo, deve ser realizada consulta presencial, com o médico assistente do paciente, em intervalos não superiores a 180 dias.
Segurança e sigilo
Os dados e imagens dos pacientes, constantes no registro do prontuário devem ser preservados, obedecendo as normas legais e do CFM pertinentes à guarda, ao manuseio, à integridade, à veracidade, à confidencialidade, à privacidade, à irrefutabilidade e à garantia do sigilo profissional às informações.
Termo de consentimento
O paciente ou seu representante legal deve autorizar expressamente o atendimento por telemedicina e a transmissão das suas imagens e dados.
Honorários médicos
A prestação de serviço de telemedicina, como um método assistencial médico, em qualquer modalidade, deverá seguir os padrões normativos e éticos usuais do atendimento presencial, inclusive em relação à contraprestação financeira pelo serviço prestado.
Territorialidade
As empresas prestadoras de serviços em telemedicina, plataformas de comunicação e arquivamento de dados deverão ter sede estabelecida em território brasileiro e estarem inscritas no CRM do estado onde estão sediadas, com a respectiva responsabilidade técnica de médico regularmente inscrito no mesmo Conselho
Fiscalização
Os CRMs manterão vigilância, fiscalização e avaliação das atividades de telemedicina, em seus territórios, no que concerne à qualidade da atenção, relação médico-paciente e preservação do sigilo profissional.