Fundamentais para uma postura ética, os programas de conformidade com leis e regulamentos se tornaram um dos caminhos para assegurar a reputação e a sustentabilidade do negócio
Você já deve ter ouvido falar de compliance, palavra originada do verbo “to comply” e que, traduzida literalmente, significa “cumprir”. O termo inglês vem dominando as áreas de gestão das empresas nos últimos anos, inclusive das operadoras de saúde. Mas cumprir exatamente o quê?
Estar em compliance significa dizer que se está agindo de acordo com políticas e regulamentos, ou seja, estar em conformidade com leis e normas, sejam elas internas, de uma instituição ou país, ou externas.
A expressão vem lá da década de 1970, quando os Estados Unidos criaram uma lei para frear o envolvimento de empresas privadas e estatais em esquemas de corrupção. Relativamente novo no Brasil, o compliance chegou com as multinacionais e está sendo incorporado pela maioria das instituições.
Compliance na Saúde
Na área da Saúde, adotar uma cultura de compliance impacta diretamente no atendimento ao cliente e é essencial para minimizar riscos, garantir o controle financeiro e definir processos, aumentando a credibilidade da instituição.
Em entrevista ao portal da Faculdade Unimed, Bruno Torchia, coordenador do MBA em Governança e Compliance em Saúde, aponta que o segmento é extremamente sensível à prática de atos de corrupção. Com o intuito de obter vantagens em negociações, muitas indústrias oferecem brindes, viagens e inscrições em congressos para médicos e gestores, por exemplo.
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“O programa de compliance é algo que atinge a organização do nível mais elevado até o nível mais baixo. Além disso, ele representa uma proteção tanto para pessoa jurídica quanto para as pessoas físicas que atuam na administração hospitalar”, ressalta Torchia, na mesma reportagem.
E não bastando a disposição para aderir a processos mais éticos, Torchia destaca que as operadoras de saúde ainda têm a obrigação legal de adotar práticas mínimas de governança corporativa e mecanismos de integridade, de acordo com a Resolução Normativa nº 443/2019.
Prática de Compliance
A Unimed Curitiba foi uma das primeiras Unimeds paranaenses e uma das cinco primeiras Singulares do Brasil a implementar a cultura de conformidade. Kelly Mendes, coordenadora de Compliance da cooperativa, lembra que a Singular e demais empresas do grupo aderiram ao compliance em 2016, quando ocorreram os lançamentos do Programa de Integridade, do Canal Legal! e do Código de Conduta.
Além de ser pioneira, a cooperativa inovou ao contar com um coordenador médico em sua estrutura, trazendo, assim, a figura do sócio no dia a dia do Programa de Integridade.
“Dr. Marcelo Marcondes Stegani é fundamental no nosso dia a dia, tanto nas questões cotidianas, pelo seu olhar imparcial, quanto sobre a melhor maneira de nos elucidar sobre as expectativas como médico e sócio”, frisa Kelly.
A Unimed Ponta Grossa também não perdeu tempo e, avistando uma oportunidade de aprimorar os processos e fortalecer ainda mais a Instituição, deu início ao projeto Compliance ainda em 2016, formatando e implantando seu Programa de Integridade.
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“Na época, já havia um entendimento de que a iniciativa era uma tendência no contexto político-econômico das corporações, como uma forma de aumentar a segurança da governança. Contar com políticas do compliance também corrobora com os princípios do cooperativismo, pois deixa atuação mais transparente não só para os cooperados, mas também para a sociedade”, assegura Eduardo Bacila de Sousa, diretor-presidente da Singular.
Base
O Compliance Officer da Unimed Ponta Grossa, Fabio Teixeira, relata que o Programa de Integridade da cooperativa está alicerçado em três pilares mestres: prevenir, detectar e corrigir. Por lá, o Programa é contínuo e conta com plano de treinamentos e comunicação periódica, ações de engajamento e conscientização, além de procedimentos internos e Código de Conduta.
“Um programa de integridade autêntico e efetivo é movido pelo engajamento e pela adesão das pessoas. Por isso, após quatro anos de trabalho, nessa nova fase do Compliance da Unimed PG, o programa de integridade ganhou um nome: o Íntegro”, revela Teixeira.
Um pouco mais recente, o Programa de Compliance da Unimed Cascavel começou em 2019, com o ingresso da cooperativa no Programa de Compliance do Cooperativismo Paranaense, promovido por meio da parceria entre o Sescoop e a PUCPR. Na Singular, ele foi desenvolvido em duas grandes etapas: nivelamento dos conhecimentos e formação e mentoria.
Com o Programa, manuais, políticas e códigos foram criados ou reformulados para atender às exigências de leis e decretos. Entre os documentos, estão o Código de Conduta, Manual do Cooperado, Política de Patrocínio, Brindes e Investimento Social, Manual de Gestão Empresarial, entre outros.
O objetivo, segundo Claudionei Cezario, do setor e Controladoria da cooperativa, é criar procedimentos que previnam, detectem e combatam fraudes, reduzindo riscos financeiros, operacionais, legais, de crédito, mercado e subscrição.
“A Gestão de Riscos da Unimed Cascavel atua de forma aliada aos controles internos como segunda linha de defesa, buscando o aprimoramento constante dos processos e a redução de riscos. Diversas ações de comunicação são constantemente desenvolvidas, buscando disseminar a cultura de compliance e institucionalizar o Programa para todos os públicos”, ressalta.
Impulso
Iniciado como projeto em 2018, foi com o mesmo Programa do Sescoop e da PUCPR que a Unimed Federação impulsionou a estruturação do Programa de Compliance e Integridade. Com o apoio e engajamento da alta direção, em dezembro de 2019 foi criada a área de compliance e destacado um grupo de trabalho formado por lideranças e colaboradores para a elaboração do Código de Conduta da Unimed Paraná. Em seguida veio o nivelamento dos conhecimentos em compliance com a participação de diretores, gerentes e coordenadores em palestras sobre o tema, já no âmbito do programa do Sescoop. Paralelamente, foi criada a estrutura de gestão ético-corporativa com a formação do Comitê de Conduta e a contratação do Canal Confidencial, que passou a operar em outubro de 2020.
“A implementação de um Programa de Compliance, com o apoio da alta direção, é fundamental para o fortalecimento de uma cultura institucional baseada em valores éticos, de integridade e transparência, o que se traduz na melhoria da governança corporativa com a consequente redução de perdas financeiras, mitigação de riscos legais, prevenção de danos de imagem e reputação, agregando valor à organização”, destaca Glauco Rodrigues, advogado responsável pela área de Compliance da Unimed Paraná.
Nesse curto período, a Federação já realizou diversas ações, como o webinar na semana do Dia Internacional contra a Corrupção, no qual participaram palestrantes de atuação nacional, e treinamento interno de lideranças sobre temas variados, desde assédio moral e sexual até apoio e engajamento de lideranças.
Para o ano de 2021, os desafios da Unimed Paraná são o aprofundamento dos processos de mapeamento de riscos de conformidade legal/ normativa e adequação dos controles existentes, o desenvolvimento das políticas essenciais ao Programa e a implementação dos treinamentos periódicos para a consolidação da cultura de compliance na cooperativa.
Retorno
Em Cascavel, Cezario relata que a criação da identidade do compliance, bem como a atualização dos documentos relacionados com o tema, foram os principais resultados obtidos até o momento. De acordo com ele, as avalições desse trabalho são percebidas pelo relatório de auditoria externa e, em breve, a cooperativa terá acesso às análises e aos controles, por meio de um sistema de informação.
“Ter uma governança corporativa de excelência e uma gestão de riscos corporativos atuando de forma preventiva pode auxiliar na tomada de decisões, tornando o conhecimento da alta direção acessível aos riscos a que a cooperativa e suas atividades estão expostas, o que é fundamental”, avalia.
Para Teixeira, a cultura do compliance transformou a Unimed Ponta Grossa. Ele diz que o ambiente da empresa ficou ainda melhor, na medida em que o respeito, o diálogo e o desejo de fazer o que é certo tem crescido. Tudo isso faz com que não haja espaço para assédios de qualquer tipo, discriminação, fraudes, condutas inadequadas e descumprimentos de regras.
“Trabalhar com este valor – integridade – que nos é tão caro, é muito bom, pois faz parte também da nossa vida como pessoa. Os desafios existem, e vão sendo vencidos em conjunto com as áreas e equipes internas que formam a Unimed PG”, garante.
Alô, alô!
A Unimed Ponta Grossa disponibiliza o Canal de Denúnciais para registro de irregularidades, que prevê, inclusive, o anonimato do relatante. A ferramenta é administrada por empresa externa e o atendimento é realizado por psicólogos e advogados especialistas, 24h por dia, 7 dias por semana.
O canal pode ser acessado tanto por telefone, por meio de ligação gratuita (0800), como pela internet e pelo aplicativo no celular.
Teixeira conta que o público que mais interage são os colaboradores. Até agora, foram recebidos 270 relatos pelo Canal de Denúncias, dos quais mais de 75% já foram concluídos e finalizados. Os motivos frequentes que se destacam nos relatos são assédio moral, não cumprimento de políticas internas, fraude ou roubo. Além disso, os relatos anônimos ultrapassam 80% dos registros.
Na Unimed Curitiba, o Canal Legal! é a ferramenta oficial de comunicação do compliance com todos os públicos, tanto externos quanto internos, é o meio para encaminhar relatos ao setor de compliance para a Unimed Curitiba e demais empresas do grupo.
Segundo Marcelo Marcondes Stegani, coordenador médico do canal, a ferramenta é utilizada para acolher relatos, sugestões e esclarecimento de dúvidas relacionadas ao Código de Conduta e recebeu 70 novos relatos no ano de 2020. Quase 80% dos relatos são encaminhados de forma anônima, e pouco menos de 93% se identificam como colaboradores.