Quando falamos de memória, não devemos pensar nesse aspecto isoladamente. É o que ensina a geriatra Claudia Kimie Suemoto – pesquisadora e professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e integrante do Conselho Consultivo da Sociedade Internacional do Alzheimer (Alzheimer’s Association).
Ela defende que é preciso ter em mente a cognição de maneira mais ampla. Isso porque a memória está diretamente associada a outras funções cognitivas, tais como linguagem, habilidades visuoespaciais, habilidades de pensar, planejar e executar tarefas, por exemplo.
“A cognição é vital para que as pessoas possam entender e se expressar no mundo. De acordo com o que chega por meio da visão, do olfato, do paladar, a gente integra essas informações, acessa as nossas experiências prévias e planeja uma resposta a essas demandas”, explica a médica.
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É essa combinação de habilidades que permite ao ser humano adquirir, armazenar e evocar informações. E, consequentemente, tomar decisões e ter uma vida autônoma. Quem nunca sofreu com esquecimentos em épocas de agenda cheia ou de excesso de afazeres? Lapsos pontuais em decorrência de momentos de estresse ou intenso cansaço são comuns. A questão essencial a se observar é quando isso começa a prejudicar a realização de atividades do dia a dia.
De acordo com Claudia Suemoto, a perda cognitiva torna-se relevante quando há uma demência em ação. Ou seja, em que é suficientemente grave para atrapalhar a funcionalidade de uma pessoa. “Quando você era capaz de fazer uma atividade de forma independente e autônoma e não consegue mais exercer determinadas funções, isso sim é preocupante. E você deve procurar ajuda específica de um médico”, orienta.
O profissional de saúde especializado vai entrevistar a pessoa que está se queixando de perda de memória, se possível com um familiar, para descrever o quadro e analisar as características das perdas cognitivas como um todo. Além de testes cognitivos, o médico pode solicitar uma bateria de exames para tentar identificar a causa.
A causa mais frequente de perdas cognitivas é a doença de Alzheimer (caracterizada pelo acúmulo de proteínas beta-amiloide e tau), ligada a 50% dos casos no Brasil. Dependendo da região do país, esse número chega a 80%, segundo Claudia Suemoto.
Em seguida, vêm os casos de demência vascular, que são consequências secundárias ocasionadas por lesões cerebrovasculares, como pequenos derrames (sintomáticos ou não) ou espessamento de vasos sanguíneos. Nessa lista das principais causas, também aparecem a demência frontotemporal e a demência por corpos de Lewy, entre outras mais raras.
Depois de identificadas as causas, existem algumas alternativas medicamentosas para as demências. Nenhuma delas pode ser adquirida sem receita médica. E embora as pesquisas tenham avançado muito nos últimos anos, com expectativas esperançosas para as próximas décadas, os resultados do uso dessas substâncias ainda são modestos.
“O que a gente sabe que realmente funciona é ter um estilo de vida saudável, controlar fatores de risco e manter a mente ativa por meio de estudos”, enfatiza Claudia Suemoto.
Fatores de risco e prevenção
Um estudo realizado por Claudia Suemoto e outros colegas pesquisadores demonstrou que 48% dos casos de demência no Brasil são secundários a 12 fatores de risco modificáveis. “Existem diferentes fatores de risco nas diferentes fases da vida que, se modificados, têm um grande potencial de prevenção de demência”, destaca a médica.
Na fase inicial da vida, o que mais influencia negativamente é a baixa escolaridade. Na meia-idade, os fatores de risco modificáveis incluem hipertensão arterial, obesidade, consumo excessivo de álcool, traumatismo craniano e perda auditiva. E depois dos 65 anos, os principais são diabetes, tabagismo, depressão, isolamento social, inatividade física e poluição ambiental.
Fica o alerta para a importância do estilo de vida. Sobretudo para quem se sente levado pela correria nas grandes cidades, exposto à poluição, imerso pelo sedentarismo e pelas opções de alimentação não saudável.