Além da equipe médica, nos bastidores da pandemia, há pessoas da área administrativa cuidando de todos os detalhes
O dia de fevereiro de 2021 ficará marcado para Kellen Dickel, coordenadora de Gestão de Clientes da Unimed do Estado do Paraná. Foi a data em que ela e a equipe perceberam que começariam a enfrentar um dos maiores desafios causados pela pandemia em suas atividades de trabalho.
“Começamos a perceber um movimento diferente no atendimento. A concentração dos casos estava na região de Cascavel. Passamos a receber de três a quatro solicitações de remoção de pacientes, simultaneamente. No primeiro fim de semana pós-carnaval, as demandas aumentaram. Ali nós pensamos: opa, tem alguma coisa acontecendo”, lembra.
Kellen coordena uma equipe de analistas que, juntamente aos supervisores e operadores do SAC (Serviço de Atendimento ao Cliente), são responsáveis por auxiliar na busca de leitos hospitalares, em qualquer lugar do Brasil, para clientes das Unimeds do Paraná, em caso de impossibilidade de internamento na região onde os pacientes estão. Ela conta que é um processo que sempre existiu, mas a pandemia da Covid-19 mudou o cenário, em especial, nos últimos dois meses.
“Nós nunca tínhamos nos deparado com a situação de falta de leitos. Os hospitais estavam saturados e isso ocorreu rapidamente. Mesmo com a distribuição interna de leitos nos hospitais, com a redução de leitos de outras patologias e o aumento de vagas para atendimento de casos com Covid, o número disponível não estava sendo suficiente”, ressalta.
Situação caótica
Antes da pandemia, a área Gestão de Clientes recebia de 25 a 28 solicitações de remoção por mês. Em 2020, a média passou para 35, e este ano, no auge dos casos de infecção pelo novo coronavírus, ela chegou a atender 200 casos por mês. Durante quase duas semanas, a equipe trabalhou, praticamente, 24 horas por dia.
“Em um determinado dia, tínhamos alguns pacientes aguardando leitos e nenhuma vaga de UTI. Foi bem difícil. As vagas foram surgindo aos poucos. O processo de regulação médica foi essencial para o direcionamento correto dos casos. O envolvimento total da equipe, o suporte das gerências médica e de rede prestadora, e todo o apoio da diretoria da Federação, que não mediu esforços para ajudar a resolver o problema que estávamos enfrentando, foram fundamentais para o sucesso do trabalho. Além do processo operacional, houve um cuidado para acolhimento dos familiares que estavam fragilizados emocionalmente, por medo de perder aquele ente querido que estava aguardando por um leito. A angústia da família era sentida pela equipe. Para tentar amenizar, mantínhamos contato com eles o tempo todo, informando-os em tempo real sobre as possibilidades de vagas. Cada vaga que conseguíamos, era comemorada pela equipe”, afirma Kellen.
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O trabalho realizado pela Federação com as Singulares para auxiliar na ampliação de leitos nos hospitais credenciados do estado, além da estruturação de leitos de retaguarda para UTI Covid em diversas regiões, deu fôlego no atendimento, pois os casos passaram a ser direcionados de forma mais rápida para locais com maiores recursos.
Das demandas atendidas pela área, 81% dos pedidos de remoção têm sido para pacientes com Covid-19. Desses casos, 65% para vagas de UTI e 35% para leitos simples. O direcionamento de cada caso tem que ser preciso e rápido, pois os pacientes podem apresentar instabilidade clínica, com agravamento rápido do quadro clínico geral.
O processo do atendimento de cada demanda só termina após a chegada do paciente no hospital de destino. As remoções, terrestres ou aéreas, são acompanhadas desde a saída das ambulâncias ou aviões das bases. Todas as etapas são realizadas e acompanhadas, rigorosamente, pela área Gestão de Clientes.
Com mais pacientes do que vagas, os casos passam por um processo de regulação médica. O gerente de Estratégias e Regulação em Saúde da Unimed Paraná, Marlus Volney de Morais, explica que a Gestão de Clientes recebe as demandas pelo SAC, por meio de uma central de 0800. Todos os dados são registrados por protocolos e, em seguida, gerenciados de forma organizada, determinando o objetivo da solicitação e a urgência de cada caso.
Ele reforça que todos os casos têm encaminhamento imediato na busca do leito se necessário e, de acordo com a complexidade do caso, devem ser verificadas condições, como necessidade de recursos especiais, por exemplo: diálise; intervenções por especialistas; nível de gravidade do caso, entre outros fatores.
“O fator distância também é decisivo, porque os casos que necessitam de remoções terrestres demoradas ou mesmo remoções aéreas exigem cuidados especiais para que o paciente não tenha suas condições agravadas no percurso até o hospital”, complementa.
Frustração
Mesmo com tanto esforço, ainda existem histórias que marcam a vida dos profissionais envolvidos na luta contra a Covid. Kellen cita que, infelizmente, a equipe já se deparou com a notícia do óbito de alguns pacientes, em que pese todos os esforços para a remoção. Esses casos afetam o emocional da equipe, pois o envolvimento para tentar salvar vidas é grande.
“Um dos casos que abalou a equipe foi de um paciente jovem, atleta e sem nenhuma comorbidade associada. Ele estava nos primeiros dias da Covid, porém seu quadro clínico agravou rapidamente e, em 24 horas, ele faleceu. Foi muito triste!”
Morais revela que, para ele, a parte mais difícil é, sem dúvida, o conhecimento das histórias que cercam as pessoas que necessitam dos cuidados médicos.
“O pior é saber que, em muitas situações, mesmo com todo empenho, vidas estão sendo perdidas para a doença e que o agravamento ocorre com uma velocidade que retira a capacidade de resposta da equipe”, menciona.
Quem também trabalhou duro para garantir o atendimento dos beneficiários foi Daniela Weber, gerente de Operações, Intercâmbio e Rede Prestadora da Unimed Paraná. Com o aumento de casos, também surgiu a demanda por leitos em todo o estado.
Nos piores dias da segunda onda da Covid, ela observa que faltaram leitos em praticamente todas as cidades. Então, o papel dela e de sua equipe foi fazer com que novos leitos de UTI e leitos de enfermagem fossem criados, para receber quem tanto precisava de ajuda. E a situação era desesperadora.
“Os hospitais não tinham mais capacidade, em alguns deles, onde a gente fez a contratação, tivemos inclusive que comodatar os equipamentos. Eles não tinham equipe e não tinham equipamentos. Para viabilizar a contratação de leitos, a Federação comprou equipamentos e deixou com os hospitais. Havia hospitais, no entanto, que não tinham nem essa possibilidade, por falta de estrutura física. Ou seja, mesmo que a Federação doasse os equipamentos não havia onde colocá-los”, relata.
Números
Com uma dedicação intensa, de acordo com Faustino Garcia Alferez, diretor de Saúde e Intercâmbio da Unimed Paraná, só a Federação conseguiu criar 44 novos leitos, distribuídos entre rede própria e rede terceira, em sete cidades e oito hospitais diferentes. O trabalho teve início no mês de fevereiro, e em 1º de março eles começaram a funcionar de forma gradativa.
“A situação está controlada agora. Entretanto, no começo, até metade de março, a gente trabalhou quase que 24 horas por dia. O número de casos graves não parava de crescer. Junto à área de Gestão de Clientes, fizemos um trabalho minucioso junto aos hospitais, ajudando-os a abrir novas vagas para os pacientes”, enfatiza Daniela.
Os novos leitos ainda ajudaram de outra forma as equipes médicas. Com leitos mais próximos de suas cidades, as equipes médicas não precisavam se deslocar por longas distâncias, passando horas na estrada para acompanhar o paciente. Assim, enfermeiras não ficavam inoperantes por muito tempo e conseguiam atender mais pessoas.
O trabalho desses profissionais faz parte de uma rede mais complexa, o Centro de Controle Estadual Covid-19. O comitê foi organizado pela Unimed Federação em junho do ano passado justamente para controlar e comandar a gestão de informações e demandas estaduais, com respostas rápidas e assertivas, aliadas à uma atuação proativa no enfrentamento da pandemia.
As equipes do Centro realizam um monitoramento em tempo real, levantam informações com agilidade e dão suporte para a tomada de decisões. Segundo Marlus de Morais, o Centro de Controle demonstrou ser um sistema de cooperação extremamente ágil, responsivo e eficiente.
“Além de possibilitar uma operação logística eficaz, esse trabalho tem se mostrado capaz de fornecer informações permanentemente atualizadas, não só do ponto de vista estatístico como também do ponto de vista científico, com atualizações sobre possíveis ações e tratamentos. Isso tudo proporciona a tomada de decisão estratégica que culmina com a rapidez e a eficiência no atendimento aos casos quando a velocidade e a gravidade da situação exigem”, pondera.
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O gerente de estratégias salienta que, graças ao grande comprometimento dos setores da Federação, é possível estabelecer mecanismos de levantamento organizado das demandas com checagem das condições clínicas, estabelecimento de pontes entre a origem da demanda e o recurso de leito disponível, o que, certamente, assegura atendimento a quem necessita.
A diretoria e os gestores da Federação estruturaram de forma emergencial condições para que todos os recursos sejam conseguidos, mesmo diante da escassez e das urgências que os casos demandam.
Segundo Bruna Gamas Dias, coordenadora da Gestão Administrativa da Unimed Paraná, para o seu setor, responsável pelas compras, os últimos meses têm sido uma corrida contra o tempo. “A compra de equipamentos e medicamentos exige bastante atenção e implica logística específica. Em um momento delicado, como na pandemia, aumenta a complexidade desse trabalho, devido à falta de opções em muitos fornecedores. Construímos uma “ponte” entre o Administrativo, área da Saúde, Diretoria e Singulares para que o tráfego de informações seja, constantemente, alinhado.
Com o trabalho coordenado do Centro, tem sido possível complementar a atuação das Singulares. O gerente de Atenção à Saúde da Unimed Paraná, Halsey Costa Resende, comenta que até o momento, a Federação já apoiou 9 Singulares com 32 respiradores, 94 bombas de infusão e 29 monitores.
“Fazemos a prospecção permanente de medicamentos de UTI diretamente nos distribuidores e laboratórios e, quando a compra é realizada com sucesso, as Singulares também recebem o material. Além disso, nossa área Administrativa, em parceria com a Unimed Mercosul, está viabilizando a importação dos medicamentos para as Singulares. Também criamos uma reserva estratégica de equipamentos que são disponibilizados em comodato para as Singulares que precisam ampliar leitos UTI Covid”, reforça.
Todas essas ações são discutidas e decididas por uma equipe multiprofissional e multifuncional, formada por setores estratégicos do Sistema Unimed (Saúde, NIIS, Operações de Intercâmbio e Rede Credenciada, Administrativo e Compras, Gestão de Pessoas, Gestão de Projetos e NDH, além da Comunicação e Marketing) e por pontos focais das Singulares.
De acordo com Marlus Morais, desde que o Centro de Controle começou a atuar, a equipe se multiplicou, não em número, mas em uma dedicação ímpar. Sensibilizados pelo momento da crise, todos passaram a trabalhar em um ritmo maior e muito mais intenso do que eram acostumados.
Para a gestora Daniela Weber, fazer parte da equipe e estar ajudando nesse momento tão difícil é uma satisfação imensurável. “Estou há 23 anos na área da saúde, dos quais 22 eu trabalhei em hospitais. Nos hospitais, isso era rotina, você está envolvido diretamente com o paciente. Quando você vem para uma operadora, acaba ficando um pouco mais distante do paciente e lidando um pouco mais com papéis, com burocracia. Agora, com tudo isso, eu me sinto mais próxima, mais atuante, ali, junto aos nossos beneficiários”, avalia.